O eterno símbolo do protesto – O cinqüentenário de um Sonho

Na cidade de Aldermaston, a 84 km de Londres, o governo britânico desenvolvia um centro de pesquisas nucleares. Como forma de protesto, o movimento pacifista CND (sigla em inglês de Campanha para o Desarmamento Nuclear), planejou fazer uma marcha até o local para marcar a fundação do grupo - no ano de 1958 -, e exigir o fim da construção de armas de destruição em massa no mundo.
Aquela era a época da Guerra Fria, estando no auge a corrida armamentista, liderada pelos Estados Unidos e pela então União Soviética, mas também seguida por outros países da Europa, entre eles o Reino Unido.
Para apoiar a campanha e ter incentivo popular, o grupo contratou Gerald Holtom, um designer comercial e artista gráfico, para projetar um símbolo que fosse forte o bastante para ser usado por toda a população como referência direta do protesto.
O resultado deu mais do que certo. O símbolo se difundiu e é usado hoje em diversos movimentos de contestação. Se antes era de uso quase exclusivo do grupo contra o armamento nuclear, a partir dos anos 60 ele serviu de estandarte do movimento da contracultura, como símbolo anti-guerra e pela paz.
Todavia, passados 50 anos do episódio, pouca coisa mudou...
Segundo cálculos do Departamento de Pesquisa de Conflitos e Paz da Universidade de Uppsala, na Suécia, autor do relatório "Estados em Conflitos Armados”, há no mundo hoje cerca de 30 guerras ou conflitos em andamento, um dos piores índices das últimas décadas.
Os pesquisadores dividem os eventos de acordo com sua natureza, que pode ser "Guerras e Conflitos Menores", categoria onde se encaixam os eventos no Afeganistão e Iraque, "Conflito Não-Estatal" e "Violência Unilateral" - neste último se encaixam, por exemplo, as FARC’s e o Comando Vermelho.
Para chegar à categoria principal, eles passam o evento pelo filtro da definição da Fundação Prêmio Nobel, que patrocina parte do estudo. Guerra, diz a Nobel, é um conflito armado em que há pelo menos mil baixas militares em batalhas, onde ao menos uma das partes envolvidas é o governo de um Estado. A entidade reconhece que, se fosse mais elástica na definição -500 mortes, por exemplo-, o número saltaria.
Dessa vez não sei o que dizer, resta-me o silêncio. O que nos falta fazer para vislumbrarmos a convivência harmoniosa e pacífica em sociedade?

“Salvamos a Democracia”

Foi com essa frase que o então presidente do Brasil Arthur da Costa e Silva declarou o início da vigência do AI-5. O Ato dava poderes ao presidente para cassar direitos políticos, aumentar a repressão dos movimentos de protesto e intensificar a censura, entre outras intervenções.
Postura semelhante à de Robert Mugabe, presidente do Zimbábue, que, pretensamente, para resguardar a democracia e defender os interesses nacionais, restringe as liberdades civis dos seus concidadãos. Contudo, nenhuma democracia existe em um país moldado quase exclusivamente para atender os anseios do mercado neoliberal, tendo como finalidade satisfazer um pequeno grupo social.
Temos que salientar que um verdadeiro Estado Democrático de Direito deve assegurar a realização da cidadania, que é a efetiva participação do indivíduo na vida política de seu país, de modo a concretizar sua vontade nas diretrizes políticas. Surge de modo que todo indivíduo se ache satisfeito em seus interesses e integrado com a realidade sócio-política nacional.
Uma verdadeira democracia tem como pilar a concretização dos direitos e garantias fundamentais dos cidadãos, planejando políticas sociais que visem atender ao maior número de indivíduos, para que estes possam fluir de seus direitos. Condição esta de realização da justiça e de respeito à dignidade da pessoa humana.
Este ano temos eleição em nível municipal, momento de legitimação à atividade pública. É chegada a hora de cada cidadão possa se valer de seus direitos e o use de como consciente, para que verdadeiros líderes democratas e não tirânicos sejam eleitos. Além de que deve ser frisado que tal condição de cidadania não se encerra após o período eleitoral, mas perdura durante toda a atividade da vida pública.
É necessário que nós brasileiros desenvolvamos o que Paulo Freire definia como vivência democrática, passando por uma reformulação cultural que nos torne cidadãos mais críticos em relação às políticas públicas, para preservar não o interesse classista - de uma minoria ou grupo segregado-, mas coletivo, incluso aí o interesse de todos nós. Salvemos então nós a verdadeira Democracia, e não deixemos que outros a salvem por nós!

A Democracia bate em sua porta

Após 1967, a ditadura militar brasileira estava aumentando a repressão contra os movimentos de protesto ao governo. E naquele período as manifestações estudantis eram os mais expressivos meios de denúncia e reação contra as arbitrariedades do governo. A cada ato de represália militar, as forças de oposição ganhavam mais apoio popular.
O movimento culminou na Passeata dos Cem Mil, em junho de 1968, que ocorreu no centro do Rio de Janeiro, na Cinelândia, sendo a maior e mais representativa manifestação de protesto ocorrida no país desde a instalação do regime militar.
Em março daquele mesmo ano, um estudante secundarista tinha sido baleado por um policial dentro de um restaurante universitário. O cortejo foi acompanhado por aproximadamente 50 mil pessoas, o que já mostrava a inclinação da população contrária aos atos de extrema violência praticada pelo regime. Em abril, outro evento marcante foi durante a missa da Candelária, no qual soldados a cavalo investiam contra todos os presentes no local.
As manifestações eram promovidas pelo movimento estudantil, mas contou também com a participação de profissionais liberais e religiosos, assim como de intelectuais, entre escritores, jornalistas, professores, cineastas, atores e músicos do país, que eram perseguidos pela censura.
Durante os confrontos com o governo, muitos jovens morriam, ou eram seqüestrados e torturados. O que atemorizava as mães era o fato constatado de que se hoje morreu um jovem, amanhã poderia ser um de seus filhos.
Esse foi um dos marcos do movimento, a grande mobilização da classe média, principalmente o público feminino. Geralmente esta é a ala mais moderada e apática perante movimentos sócio-políticos. Evento que se tornou comum nos movimentos contrários às ditaduras latino-americanas.
Com maciça adesão popular, refletindo o seu crescente descontentamento, o movimento reivindicava o fim da censura, o restabelecimento das liberdades democráticas, pondo fim à repressão e a redemocratização do país. Porém, em dezembro daquele ano, o governo endureceu o regime editando o Ato Instituição N.5. Os Anos de Chumbo, como assim foram chamados, representou o período em que a população viveu perante grande temor e subjugada à violência estatal.
No início do governo do até então Estado da Guanabara (entre 1965-1970), Francisco Negrão de Lima tinha como campanha a mensagem de que ao final de seu governo, quando alguém batesse em sua porta, você poderia ficar tranqüilo que não se trataria da polícia, e sim do leiteiro. No entanto, não foi o que houve.
Mas se momentaneamente nada mudou no panorama nacional, tendo inclusive aumentado a repressão, ainda assim o movimento não fracassou. A maior revolução obtida foi a mudança de mentalidade. A população passou desde então a ter maior consciência política, que levou sim, em certo prazo, na redemocratização do país. Só me falta saber se, depois do ocorrido, ainda temos a mesma consciência de antes...

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